Crônica da Vida que Passa… (14)

OS(AS) ESCRITORES(AS) DESAPARECIDOS(AS)

Hoje, passeando pelas redes sociais entre um afazer e outro, lembrei-me dos escritores(as) encontrados(as) em minhas primeiras incursões em feiras e encontros literários. Na época, eu escrevia quase nada e a pretensão de escrever algo realmente ‘grande’ dominava o cenário dos meus dias, mas sem ter muito como ou o que realmente escrever, e sem saber se seria capaz. Confesso que ainda tenho dúvidas sobre a qualidade do que eu escrevo. E você pode até concordar comigo, me dizendo ‘tem razão, não escreve lá grandes coisas’.

Lembro da minha primeira ida a São Paulo, no lançamento de uma antologia, Dimensões BR. Minha irmã escreveu um conto e foi para o lançamento, levando-me junto. Momento mágico encontrar amigos(as) distantes, mas também escritores(as) já experientes, e entender que, naquele universo era preciso escrever todos os dias.

Lembro-me que na primeira Odisseia de Literatura Fantástica, em Porto Alegre, junto de minha irmã que já escrevia, encantei-me com aquele universo de pessoas ligadas à fantasia, ao terror, ao suspense. Maravilhada com os livros e com os(as) ‘donos/donas’ dos livros, cheguei em casa com um amontoado deles e os devorei, querendo entender o processo de criação de histórias de mundos distantes, de seres mágicos. Abocanhei cada página que eles possuíam, querendo entender que tipo de escrita era aquela, como se dava a construção de cada história, e busquei informações sobre eles(elas), tão simpáticos(as) naquele encontro, e tão dispostos(as) à troca de ideias. Quis saber tudo o que foi possível.

De 2012 para cá, alguns(umas) simplesmente sumiram do círculo da escrita, ocuparam-se com outras atividades, largando mão da Literatura, da construção de seus textos, do contato com leitores, para alavancar outros projetos. Lembro-me de blogs e sites de escrita maravilhosos, cujo propósito era não apenas de alavancar a carreira de seus gerenciadores, mas dar voz a muitas outras vozes, através das colunas de temas específicos, resenhas de livros, indicações de leitura, conteúdos sobre a construção literária, sobre elementos da escrita.

Em 2012 também, dei início a construção de um blog. Inexperiente, jogava lá meus textos, imagens, poemas, reflexões sobre quase tudo. A medida em que participava de antologias, conseguia visualizar melhor meus objetivos. E assim foi que, em 2016, reestruturei meu espaço no WordPress, mais organizado, tentando definir o que era o quê, e como repaginar aquilo tudo.

Mas voltemos aos escritores(as), aqueles(as) que conheci ao longo de alguns anos e que, hoje, não escrevem mais. Fico a pensar sobre os motivos que os(as) levaram a parar com a escrita e com a interação social e penso que talvez a dureza dessa nossa realidade brasileira seja mais forte do que a vontade criativa, do que o tempo necessário para a construção textual. E não os(as) culpo por parar de escrever e dedicarem-se a outras atividades econômicas, apenas lamento. Em um país igual ao nosso, escrever não é apenas rebeldia, não é apenas coragem, não é apenas por gosto ou querer. Exige muito esforço. Escrever é oneroso. Escrever requer do sujeito uma força incomum, um jogo de cintura que nem sempre é possível, uma disponibilidade que nem todos têm. Economicamente inviável. É preciso comer, pagar o aluguel, água, luz, telefone. E se tiver família, filhos… Como se sustentar apenas com a escrita?

Talvez esse seja o empecilho mais gritante em nossa realidade brasileira: precisar trabalhar em outro setor, muito diferente e distante da escrita para poder sobreviver. Minguar o tempo de construção literária em função da dura realidade econômica imposta.

E eu sequer entrarei na existência de uma cultura avessa à Arte e a Literatura; uma cultura que não enxerga nesses dois eixos uma necessidade humana e, por consequência, uma função específica, algo que tenha valor e agregue à vida ordinária algum sentido ou alguma riqueza, mesmo a material.

Se há um caminho para retomar a Literatura? Acredito que sim, em algum momento, sim. Se lermos as trajetórias de alguns escritores(as) ao longo da História, com ou sem fama, ou nem tanto, muitos(as) retiraram-se da escrita para sempre, sim, mas muitos(as) outros(as) a retomaram posteriormente. Meu desejo é que retornem a esse caminho e concluam sua jornada interrompida pela realidade. Que voltem a despertar a sensibilidade, as emoções, as reflexões em seus leitores, e consigam edificar alguma mudança ao seu redor, alguma transformação na vida e no mundo, para melhor, lógico, porque é disso que precisamos, afinal.

Sugestões de leitura:

UM

DOIS

TRÊS

Sobre a imagem dessa publicação:

Imagem de KoalaParkLaundromat por Pixabay

Publicidade

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s