
O Castelo da Lua
Ao pé da colina, na beira do precipício, bem ao sul do território, Valjean, ainda criança, viu o pai construir um castelo. Uma década dedicada ao palácio. Arquitetos e pedreiros do reino fizeram subir a edificação em tempo recorde e obreiros de várias partes dos territórios adjacentes completaram os detalhes.
O soberano planejou com minúcia cada uma das salas, passarelas, escadas, torres e muradas. Cozinha, biblioteca, quartos vazios exceto dois, localizados na torre mais alta. Pedras brancas sobre pedras brancas, certificou-se da vedação de cada cubículo, de cada passagem, tanto nos porões quanto nos andares superiores. Janelas gradeadas e adornadas em baixo-relevo em prata. As únicas janelas sem grades tinham vista para o mar e estavam na torre dos quartos mobiliados, mas sem saída a não ser para o abismo.
Uma porta pesada cuja tranca travaria após a primeira descida constituía-se único acesso ao castelo.
Na cobertura, firmou bandeiras brancas e totens adornados com a imagem da lua.
Do lado de fora, impôs um cercado de lanças com pontas de prata inclinadas 45° para dentro e para fora contornando cada lado do burgo. E, antes da barreira pontiaguda de aço, uma extensa área de espinheiros, sem qualquer estrada, sem qualquer brecha de passagem.
Valjean viu as árvores frutíferas de várias espécies crescendo no pátio interno. No centro, um jardim com acônitos, freixos e rododendros roxos e uma pequena horta com especiarias. Um galinheiro e um chiqueiro na ala mais afastada. Por noites a fio, observou seu pai enfeixar uma obra única com textos e relatos sobre o cultivo das espécies vegetais e sobre a criação dos animais, sobre o preparo de alimentos, sobre medicina caseira e organização doméstica.
Durante longos dez anos, o pai o ensinou a ler, tocar violão, cozinhar, cultivar os alimentos, falar os dialetos da região, misturar as ervas, entender o céu de cada estação, as fases da lua. No dia do décimo oitavo ano de Valjean, o soberano fez descer a pesada porta, trancando-se no castelo com o filho. Subiu ao terraço e sentou-se com ele em meio aos totens esperando a lua cheia crescer no horizonte.

O Escudo de Nirmud
Naquele tempo, o reino era desmilitarizado, desprovido de exército e ganância. O único combate aceitável era o combate à fome que, em época de seca ou enchente, destruía os sonhos de uma sociedade justa e evoluída. Por esse motivo, as mãos de Nirmud plantavam os grãos, curavam os doentes, caçavam e escreviam as leis dos antigos. Nenhum outro cidadão tinha tanto prestígio quanto ele, o predestinado.
Foi difícil conviver com a guerra cósmica, trazida por exércitos desconhecidos, rasgando a terra e criando feridas profundas. Foi igualmente difícil ver seu pai e seus irmãos morrerem sob espadas faiscantes que jamais manuseara. Nirmud correu pela pradaria descalço, de mãos vazias, competindo com o vento e clamando pelos deuses de sua crença.
Então, caiu diante de um escudo cujas cores assemelhavam-se às chamas da forja e tão brilhante quanto as pedras reluzentes encontradas nos rios. Junto dele, uma maça, semelhante às clavas de madeira que seus ancestrais carregavam, mas diferenciada pelo material, tão reluzente quanto o escudo.
Os deuses haviam atendido seu clamor. Ele tomou o escudo e desceu para onde a luta acontecia. Não houve espada capaz de quebrar sua defesa; nenhuma arma capaz de macular seu corpo. Nirmud fez tombar os inimigos, um a um; sucumbiram diante dele.