Retrospectiva

Retrospectiva

2021 foi, sem dúvidas, muito mais controverso que 2021. Não vou me deter nos dissabores vividos. Quero, sim, tornar evidentes as realizações, especialmente na área de Literatura, onde entre exercícios de escrita e publicações consegui elevar os ânimos e afastar … Continuar lendo

Esperança – Miniconto

Esperança – Miniconto

Esperança juntava as mãozinhas, fechava os olhos, entrava e ficava imóvel durante oculto. Sua mãe, ao lado, achava estranho, a atitude, o jeito tão ingênuo, o balbucio de palavras incompreensíveis, mas adorável de qualquer modo. A menina não saia de … Continuar lendo

E-book gratuito!

E-book gratuito!

Em 2017, foi lançado o e-boo REALIDADES CABULOSAS – vol. 1, do Leitor Cabuloso, uma antologia pra lá de diferente. Nela, participo com um conto e micronarrativas. O e-book está disponível para download no site. É só clicar AQUI para … Continuar lendo

Convite para leitura

Convite para leitura

Final de ano chegando e resolvi reforçar o convite à leitura de alguns textos escritos por mim para a Coluna Asas, da Caligo Editora. A oportunidade de escrever para a coluna surgiu através do grupo dAs Contistas, da qual faço … Continuar lendo

O Taumaturgo – Um Conto de Natal

Vila de São Simão, RS.

23 de dezembro de 1910

Da pequena vila de São Simão até onde morava, Giuseppe precisava pedalar quinze quilômetros. Parte do trajeto na bicicleta, parte conduzindo o veículo, morro acima. Trajeto penoso, mas bonito de ver. Ladeada por capoeiras e lírios brancos, cajados de Giuseppe, naquela época do ano, lembrava-se de sua mãe e da devoção ao santo. Que Deus a tivesse ao lado Dele, sussurrava, e fazia o sinal da cruz.

Naquele começo de tarde, vencida a última subida, seguia com as ferramentas e os pregos enrolados em uma sacola de pano e alguns pedaços de madeira ajeitados com cuidado entre o guidão e o ferro do selim. Tentava não perder o equilíbrio naquela estrada estreita de terra e pedregulho.

Avistou o sujeito depois da curva e reduziu a velocidade. O homem alto, de barba mal feita, vestido com roupas simples, parou a caminhada e sorriu. Levava uma mala surrada e um saco às costas.

— Tarde!

— Boa tarde. — Educação ainda tinha um pouco, apesar da desconfiança inicial. Giuseppe balançou a cabeça em um cumprimento discreto. Não era nada comum encontrar negros ali pelas redondezas. — Tá perdido?

— Não. Só tô seguindo.

— Por esses lado não tem estrada que segue. Essa vai dá lá em casa.

— Acho que vô descansá debaixo duma árvore e vortá pro caminho quando refrescá, ou amanhã de manhãzinha.

— Melhor não. Não tanto pelos mosquito, mais pelas cobra. O calor faz elas saí. Tá andando faz tempo?

— Tô no trecho desde cedo.

Giuseppe, apesar de agricultor sofrido, verdade seja dita, mas procurava manter vivos os ensinamentos tanto da mãe quanto do padre. Apesar de não ter muita simpatia por gente de cor,  o sujeito parecia em pior situação:

— Pode descansá no porão de casa e segui de manhã cedinho.

— Carece não sinhô.

— Não é bom passá a noite no tempo.

— Se não trapaiá, aceito a oferta.

— Tem mais um caminho ainda pela frente. Como é teu nome?

— Nico. Nicolau de Jesus, o seu criado.

E nem bem terminou de responder, Giuseppe reconheceu a voz do filho mais velho o chamando.

— Pai! Pai! — O garoto corria e gritava.

Giuseppe largou a madeira e pedalou ao encontro dele. Nico recolheu as tábuas e seguiu na mesma direção.

— Pai!

A freada fez a poeira levantar.

— Que foi? — Largou a bicicleta e agarrou o menino pelos ombros. — Que aconteceu? Fala, piá!

O menino puxou o ar para refazer-se da corrida e o andarilho chegou a tempo de ouvir o final da conversa.

— Lucas não tá bem. Nem acorda. A mãe mandô encontrá o senhor.

Giuseppe deixou a sacola com o filho sem importar-se com coisa alguma. Em poucos instantes desapareceu depois da curva da estrada. O menino analisou o estranho de cima a baixo. Calado, jogou a sacola no ombro.

— Eu levo a madeira pro cê — o forasteiro sugeriu. — Como ocê chama?

— João.

— Muito bão, João. Vamo apressá o passo pra ajudá o seu pai. O que cê acha?

Com um sim pouco animoso, o menino seguiu em silêncio, sequer curioso por saber quem era o estranho. Vez ou outra, olhava-o de atravessado, mas apesar do ar receoso, seguia em frente. Se o sujeito estava com o pai, não tinha problema.

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Poema

Poema

Pão e Osso De olhar doce e atento,observa o mundo que passa perto.Já brincou, quem sabe não,quem sabe é o tempo.É preciso ser esperta.Passa a vida ali, no sossego,guardando os caminhos,no relento.Se ajeita como pode,no abandono,sem alvoroço.Outro já foi seu … Continuar lendo

O que é uma gripezinha para quem está terraplanado?

O que é uma gripezinha para quem está terraplanado?

Texto de FÁBIO SHIVA (acompanhe o autor no INSTAGRAM, FACEBOOK, SKOOB, BLOG) Resenha do livro “NÃO SEREMOS OS MESMOS JAMAIS” (vários autores – organização de Bia Machado) Em meados de 2020, quando estávamos vivendo os apavorantes e inesquecíveis primeiros meses … Continuar lendo

Histórias Fantásticas (7)

Cercado 3

Vasculhou as prateleiras aéreas. Encontrou biscoitos e pão. Abriu o refrigerador. Separou a carne, embalando-a em um recipiente de plástico. Depois, o queijo, em outro, e o leite. Várias caixas de leite. Juntou um dos guardanapos maiores e colocou dentro da cesta. Organizou os itens lado a lado. Abriu as portas do balcão debaixo e retirou algumas latas de conserva.  Abriu-as, colocando o conteúdo em outro pote. No dia seguinte, precisaria fazer uma visita ao supermercado.

A mãe, sentada à janela, recostada na cadeira estofada, segurava o cordão de contas e dividia a atenção entre o jardim multicolorido em seus desenhos labirínticos e a movimentação do filho. “Caprichoso”, sempre pensava, lembrando-se em como a delicadeza fazia parte da vida de Anton. Desde criança, em pequenas incursões pelos arredores, juntando coisas, analisando, fazendo experiências. Depois, adulto, os estudos mais complicados, o amontoado de livros, de vidros, de líquidos coloridos, seguindo os passos do pai.

O pai… O pai sentiria orgulho. Um filho inteligente, recluso, mas inteligente, dono de uma propriedade daquele tamanho, comprada com o trabalho de pesquisa realizado naquelas grandes corporações industriais. Ao vê-lo assim, homem feito, dono de uma pequena fortuna, sim, o pai encheria o peito e sustentaria o mesmo olhar altivo da época em que arrecadava reconhecimento pelas descobertas químicas.

― Eu não me demoro ― beijou-a na testa. ― Vou até o cercado 3.

― O cercado 3?

― É, mãe. Preciso alimentar os dinossauros.

Ela o segurou pelo braço e disse a única coisa que era possível dizer. ― Tenha cuidado.

O Mercador de Tapetes

“I am not from here
My soul came from the land of deserts, Date trees & Oasises
I can sense it in my love of watching golden red sun sets
In my longing for the endlessness
of the desert
For The Oasis & The lone veiled passenger wandering
to give his secret of alchemy to the Worthiest”

~ Hoorayen Fatima ~

“Moro ao sul do grande deserto, a leste do único e mais antigo oásis”, respondeu Amir para a criança, enquanto escolhia os panos vermelhos.

O comércio de algodão aquece a economia de Mázaca, uma cidade situada na rota dos viajantes e mercadores do mundo. Pinturas nas paredes, esculturas de barro, espelhos de obsidiana e baixos-relevos emprestam charme às ruas de chão batido, de panos nas janelas e toldos coloridos. A cidade se estende em uma planície verdejante, rodeada de colinas com florestas ao pé de um vulcão.

“É muito longe?”

“Mais de 8 luas, pequeno Damat”, respondeu o mercador.

Amir viaja duas, três vezes ao ano dependendo da demanda. Leva especiarias da sua região e volta com tecidos e tapetes. Sua caravana é pequena, composta por 10 camelos. O mais velho e mais bem cuidado; herança de seu pai.

“Pode levar o Peregrino com você?”, apontou para o homem a poucos passos deles. “Ele precisa chegar ao oásis e você é o escolhido.”

Amir analisou o homem de muita idade em vestes modestas segurando um cajado.

“Talvez seja bom trocar a companhia da solidão pela companhia de alguém.”

O garoto não esperou. Saiu em direção ao velho, recebeu algumas moedas e desapareceu pela ruela lateral. Amir aproximou-se do homem e cumprimentou-o com reverência.

“Sou Amir, de Sharurah, filho de Emir de Najram. Minha caravana parte antes do sol. Posso colocar seus pertences em um dos camelos.”

“Tudo o que carrego está aqui comigo”, e retribui a saudação, sou ‘Shaheen’.

No alvorecer, a caravana partiu. Amir seguiu na frente, seguido de perto pelo Peregrino. Foram 8 luas de pouca conversa. O mercador, acostumado com o silêncio, entendia que o velho poupava fôlego. Ora caminhando, ora sobre um camelo, a paisagem não mudava. Areia para todo o lado, um ou outro oásis para abastecer os cantis e matar a sede. Em todo o trajeto, Amir observou o falcão sobrevoar sua caravana. “Bons presságios, Shaheen” apontou para o céu e o velho assentiu. “Uma jornada tranquila.”

“Um caminho horado,” acrescentou o Peregrino.

No último oásis, perto da hora do pôr-do-sol, o Peregrino sentou-se ao lado de Amir, aceitando o cantil e servindo-se de um pouco.

“Está na hora de eu partir.”

O sol, descendo no horizonte, avermelhava a areia e o verde da vegetação ao redor do oásis dourava.

“Estamos perto da minha aldeia. Mais um dia e meio”, explicou o mercador, atiçando o fogo. “Poderá descansar em minha humilde casa e, depois, seguir viagem.”

Nos olhos do Peregrino, o brilho do sol e do fogo se misturaram. Era velho não só pela barba e cabelos brancos.  Estendeu seu bastão a Amir. “Um presente.” Amir o tomou para si. “Aceite.” E, do alto, o falcão soltou sua voz poderosa e rouca enquanto corrupiava. “Minha jornada termina aqui e a sua começa hoje, Amir, de Sharurah, filho de Emir, de Najram. Haverá dias de luta, de tornar o espírito forte, de fazer valer a Lei.” E dizendo isso, silenciou e fechou os olhos, como se meditasse. O falcão desceu do alto e assentou-se no ombro de Amir, deslumbrado pela presença da ave e completamente arrebatado pelo momento. E quando o deserto mergulhou no último raio de sol, a poeira ao redor de Shaheen ergueu-se e ele evaporou-se junto dela.